Casa Mundo News #23
Gagacabana e Soft Power, IA no divã, Audiência em Colapso, e um exercício: como seria Adolescência se retratasse uma menina?
Um olhar para o que se move por trás dos grandes fenômenos.
Vivemos em um cenário onde visibilidade, influência e projeção tornaram-se moedas valiosas — seja no entretenimento, na tecnologia, na cultura digital ou na forma como cidades se posicionam globalmente. Mas por trás dos grandes acontecimentos e narrativas de sucesso, persistem tensões estruturais, comportamentais e simbólicas que merecem atenção.
Esta newsletter propõe uma leitura atenta dos bastidores: da potência do soft power carioca aos desafios da inteligência artificial no cotidiano; das transformações no consumo de conteúdo ao impacto silencioso das redes sociais sobre a saúde mental de meninas. Em comum, a tentativa de compreender como estamos lidando com exposição, performance e pertencimento em tempos de acelerada mudança cultural.
Lady Gaga no Rio e o Soft Power que o Brasil ainda subestima
O maior show da história de uma artista feminina não aconteceu em Londres, Paris ou Nova York — mas na orla de Copacabana. Mais de 2 milhões de pessoas, R$ 600 milhões movimentados e uma cidade inteira no centro da cultura global por uma noite. O impacto econômico é evidente, mas o que está em jogo é ainda maior: o fortalecimento do soft power carioca como força estratégica para o Brasil.
Enquanto países como Coreia do Sul, Espanha e Canadá investem há décadas em cultura como ativo de influência, o Brasil — apesar de sua imensa potência criativa — ainda hesita em transformar imagem e identidade em estratégia de país. No ranking global de Soft Power, caímos posições em áreas como educação, mídia e governança. Mas o Rio mostra que há caminho: com vocação internacional, apelo midiático e capacidade de mobilização afetiva, a cidade pode ser a principal plataforma de influência do Brasil no mundo.
Quando o ChatGPT vira seu melhor amigo
De aliada prática a conselheira emocional, a inteligência artificial tem ocupado um novo lugar: o da companhia. Um estudo recente mostra que 13% dos brasileiros já recorrem à IA como amiga ou terapeuta. Globalmente, segundo a Harvard Business Review, as principais aplicações da tecnologia em 2025 não são mais produtividade ou criação — mas conforto emocional.
Esse movimento é um sinal dos tempos. Em um mundo acelerado, hiperconectado e solitário, a IA oferece algo tentador: atenção ilimitada, respostas imediatas e ausência de julgamento. Mas essa nova intimidade com os algoritmos levanta alertas. Pesquisas do MIT revelam que o uso intensivo do ChatGPT está associado ao aumento da solidão e da dependência emocional, especialmente entre mulheres.
Estamos diante de uma mudança profunda: mais do que uma ferramenta, a IA virou espelho. E o que ela reflete é um desejo crescente por escuta, presença e acolhimento — justamente onde nossas relações humanas têm falhado. Como alerta o filósofo Renato Noguera: não se trata de negar a tecnologia, mas de entender seus efeitos sobre nossa forma de viver. Usar IA não é o problema. O risco é quando ela vira o único lugar onde nos sentimos compreendidos.
Audiência em Xeque
A audiência da TV brasileira está em crise — não (só) de público, mas de métrica. Pela primeira vez, a Globo questionou publicamente o modelo do Kantar Ibope, que há décadas define quem está assistindo o quê. Segundo a emissora, a medição atual não dá conta da realidade: ignora o consumo fora de casa, o streaming, o YouTube, o TikTok e o modo como as pessoas realmente acompanham os conteúdos hoje.
Hoje, o Ibope projeta a audiência nacional a partir de apenas 6.310 domicílios em 15 regiões. Com base nesse recorte, uma novela assistida por até 30 milhões de pessoas pode aparecer com apenas 9 ou 10 pontos no gráfico. O número que aparece no jornal não reflete mais a atenção real.
O que está em jogo não é só uma disputa por prestígio — mas por relevância de mercado e orçamento publicitário. O desafio agora é construir uma métrica que una formatos, plataformas e contextos diversos. Uma régua moderna, que acompanhe a fragmentação do consumo sem perder o que mais importa: impacto. Porque audiência, hoje, não é onde se assiste. É onde se fala, compartilha e repercute.
E se Adolescência retratasse uma menina?
Enquanto os meninos estão sendo capturados por fóruns misóginos e discursos violentos de masculinidade em crise, as meninas enfrentam um colapso silencioso — e socialmente aceito. Transtornos alimentares, distorção de imagem, autolesão e vício em performance são formas contemporâneas de sofrimento feminino que se escondem sob a estética do autocuidado.
A adolescência das meninas, em vez de ser contada por radicalizações ideológicas, tem sido moldada por algoritmos que vendem disciplina como beleza, controle como autoestima e magreza como conquista. Não há fórum, mas há feed. E ele também adoece. Estudos mostram que meninas são mais suscetíveis a distúrbios de imagem após a puberdade, com um impacto direto do consumo de conteúdo que glorifica o corpo perfeito e a rotina ideal.
Se os meninos são empurrados à raiva, as meninas são empurradas ao autojulgamento. A masculinidade entra em crise; a feminilidade vira prisão. A pergunta que fica é: por que ainda romantizamos esse sofrimento — e por que ele segue tão invisível?
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perfeito, ótimas temáticas!
Adorei!